Quem ainda não se deparou, com pessoas
de língua estranha, provavelmente chinês ou coreano, entupindo a frequência no
Canal 68 do seu rádio VHF?
Na Baía da Guanabara notadamente, os
operadores do Eco-21 e E-37, Iate Clube do Rio de Janeiro e Marina da Glória,
respectivamente, tentam liberar a frequência, utilizada no Brasil pelo Iatismo,
o problema é que esta não é uma regra geral e os rádios produzidos para o
mercado Norte-americano ajudam a complicar as coisas.
Sabemos que nossos “irmãos do Norte”
dominam o mercado náutico mundial. Para
se ter uma ideia, havia 12,5 milhões de barcos registrados em 2011, enquanto
que no Brasil não passávamos de 400 mil, nesta mesma época. Portanto algumas
regras que eles determinam, acabam influenciando os fabricantes de
equipamentos, e esforços de poucos não costumam fazer frente ao gigantesco apelo
do mercado americano.
A ITU, (International Telecommunication Union) é um órgão da ONU que
orienta sobre as telecomunicações no mundo, mas isto acontece de forma
diferente em cada país. Como exemplo, a FCC (Federal Communications Commision) a ANATEL dos Estados Unidos,
determina o uso das frequências de maneira diferente de outros países.
Na prática, se você ligar um rádio
VHF, irá verificar que no display, além do número do canal, aparece embaixo uma
“colinha”, indicando qual a finalidade do canal em uso, porém esta indicação
pode variar de fabricante para fabricante e depende até do país para que foi
produzido, notadamente os EUA.
De todas as possíveis variáveis, alguns
canais são internacionalmente respeitados. No Canal 16 aparece sempre “Calling” por ser o Canal Internacional
de Chamada; assim como no canal 70 vai aparecer DCS, um canal destinado
exclusivamente as chamadas Digitais Seletivas, que faz parte do sistema GMDSS,
e permite que se chame uma determinada embarcação, como se fosse uma chamada de
celular, utilizando-se o MMSI, um número que identifica cada estação.
Outros canais não são tão respeitados. O
Canal 06, reservado a comunicações de segurança e resgate, ou o Canal 13 que
pode ser utilizado apenas entre as pontes de navios que estejam realizando
entrada ou saída nos portos, mas muitas pessoas não têm sequer ideia disto. No
Brasil os navios costumam utilizar o Canal 14 para comunicação interna entre as
estações de manobra, assim como a Praticagem costuma utilizar o Canal 11, mas
nenhuma destas regras é de uso ou conhecimento geral, e muita confusão acontece
no ar.
Agora, quando seguimos para o Canal 68, nos
deparamos com a indicação “Ship-Ship”,
ou seja, destinada a comunicação entre navios, ficando reservados para “Pleasure” (Recreio), os canais 69 e 71.
Com isto se forma uma confusão local, pois muitos dos Iate Clubes no Brasil,
utilizam tradicionalmente os canais 68 para chamada e 69 para tráfego, entre
suas estações costeiras de apoio e os barcos afiliados ou não. Porém, os navios
utilizam o Canal 68 para comunicação entre navios, e é muito comum que os
oficiais façam uso desta frequência para “colocar o assunto em dia” com colegas
conterrâneos, ou mesmo para trocar qualquer tipo de informação. Um verdadeiro
canal de “bate-papo”.
No passado, contávamos com a Dentel, uma espécie
de Delegacia das Telecomunicações, que não só ordenava o uso das telecomunicações
em nosso litoral, mas também as fiscalizava, com força de polícia, contando com
estações rastreadoras portáteis e atuando na limpeza das frequências,
absurdamente utilizada por alguns. Sem falar nas estações de radio clandestinas,
que prejudicam o seríssimo tráfego de radio entre aviões e aeroportos, mas vou
me ater apenas ao uso marítimo.
Certa vez, em Angra, ouvi um restaurante
fazendo propaganda de seu cardápio especial do Dia das Mães, no Canal 16 do
VHF. Neste caso, havia várias infrações gritantes:
·
A Operadora não era
licenciada, caso contrário saberia que não se pode utilizar o VHF para
propaganda;
·
Fazer propaganda
no VHF, como dito, é proibido – no canal 16 então? Um absurdo!
·
A Estação era
clandestina, pois ficava numa ilha e pertencia a um restaurante, e não a uma
embarcação;
·
Esta pouca gente
percebeu no dia, mas apregoar que seus pratos seriam preparados com “camarões
frescos”, durante o período do defeso do valioso crustáceo, também é indício de
crime ecológico. Uma lambança!
Outra má
recordação de uma determinada época na Baía da Ilha Grande era a do conhecido
“Jacaré Cabeludo”, uma pessoa que invadia o Canal 68 com transmissões
agressivas e cheias de palavrões, me lembro bem de um dia, em que uma forte tormenta
de Sudoeste atingiu a região, e um veleiro em perigo não conseguia pedir
socorro devido à incessante transmissão do referido operador. Conta a lenda que
ele foi localizado, demitido do barco e expulso da marina em que trabalhava,
mas ninguém sabe ao certo de quem se tratava. Não deixando saudades.
Transmissões
ofensivas são uma constante no Canal 16 em plena Baia da Guanabara, frequência
praticamente impossivel de ser utilizada naquela área, e apenas uma ação nos
moldes do antigo Dentel poderia reverter o quadro de desrespeito e irresponsabilidade
que invade nossas frequências.
Quanto ao
uso do Canal 68 pelos pobres e saudosos tripulantes dos navios, não há muito a
fazer, pois remamos contra a maré e seria mais fácil adotar o que quase o mundo
todo faz, passando a operar nos canais “Pleasure”,
69 e 71 e acabando com uma contenda desnecessária.