segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Licença Made in Brazil

Mesmo sabendo que nosso litoral tem dimensões continentais, e que muitos nunca navegaram em locais como o Rio Amazonas e seus incontáveis afluentes, ou mesmo na perigosa Lagoa dos Patos, nossos navegadores mantêm um enorme fascínio por navegar por águas internacionais, como se isto fosse mais complexo do que sobreviver aos lugares citados acima, o que às vezes não é bem verdade.

Numa de nossas viagens, enfrentei uma dificuldade até certo ponto cômica, se não fosse trágica. Foi ao dar entrada com os papéis do barco em uma minúscula Capitaneria di Porto na Itália. O Oficial de serviço quis ver a minha habilitação, e após entregá-la recebi um sonoro “questo no vale niente” (em tradução para o italhanês). Eu havia dado a ele a minha Habilitação de Capitão Amador brasileira, que por sinal vem escrita até em inglês. Porém, ele me fez uma pergunta praticamente sem resposta: Como voce pode ser o Capitão do barco, ou seja, está embarcado profissionalmente e me apresenta uma Licença de Amador? Fica difícil de responder...

Depois desta experiência, juntei um grupo de pessoas bem intensionadas, e tentamos convencer alguns oficiais da DPC (Diretoria de Postos e Costas), a reconhecer formalmente esta categoria profissional, que continua ainda envolta num manto de indefinição, a que chamo de Categoria dos Iatistas Profissionais. Nossa intensão era fazer com que a Marinha criasse o Sétimo Grupo Profissional, como já são os Marítimos (profissionais que trabalham em navios), os mergulhadores e vários outros.

Visto que nossa “força tarefa” não conseguiu sucesso, recebemos agora com grande otimismo a chegada de uma Escola franqueada pela IYT – International Yacht Training (http://www.iytworld.com/) entidade reconhecida pela MCA (British Maritime&Coastguard Agency) assim como dezenas de outras prestigiadas Marinhas ao redor do mundo, como a Norte Americana, Australiana, Canadense, Irlandesa, Ilhas Cayman, Croacia e da influente Ilhas Marshal, segundo maior porto de registro de iates do mundo.

O que isto siginifica, é que ao fazer um curso no Brasil, podemos obter uma Licença reconhecida mundialmente, a de Yacht Master, e com ela poderemos depois galgar as licenças Profissionais, a que chamam agora de Worldwilde Master Of Yachts - MOY 200 gt Limited e MOY 200gt Unlimited – o que permitiria embarcar nas mais diversas funções em iates de charter ou não, ao redor do planeta. O sistema IYT possui mais de 150 escolas reconhecidas ao redor do mundo, em 41 países e ministra cursos em seis idiomas (agora acho que sete).

Estes cursos iniciais são praticamente obrigatorios para quem almeja categorias profissionais, e no caso pedem experiência comprovada de embarque e a Carteira de Capitão Amador,
No Brasil, a Escola Náutica Azimuth de Ilhabela (http://www.escolanauticaazimuth.com.br), já esta ministrando cursos de Yachtmaster até 200 toneladas (AB) e, na seqüência poderá emitir outras habilitações destinadas a embarcações de maior tonelagem. Os cursos são ministrados em Ilhabela, mas turmas no Guarujá e Angra dos Reis já estão acontecendo.

Com esta licença, é possivel alugar barcos sem tripulação no exterior, e no caso de alguém vir a adquirir um Iate de bandeira estrangeira, não deverá enfrentar problemas com sua seguradora, visto que estas licenças são as mais bem aceitas ao redor do mundo.

Lamentavelmente, tinhamos a esperança de criar uma certificação internacional sob nossa própria bandeira, onde a nossa DPC emitiria, como de direito é, o Certificado Internacional de Competência para Iatistas Profissionais, mas acreditamos (com fé) que ela passe a reconhecer as licenças emitidas sob o padrão MCA, assim como várias outras autoridades marítimas ao redor do mundo, como comentado acima.

O que importa é galgar um padrão de habilitação internacional, e que ele permita que sejamos reconhecidos por nossa experiência e habilidades, aumentando nossas chances de trabalhar em grandes iates por todos os mares do mundo, sem sofrer restrições. Pesquisas publicadas recentemente, dizem que o mercado de Superyachts deverá criar cerca de 65.000 novos postos de trabalho ao redor do mundo, nos próximos anos.


Quem sabe, no futuro, possamos operar grandes barcos de charter, com tripulações brasileiras bem treinadas para fazê-lo, visto que a qualidade de serviços já temos, só falta treinamento, padronização e certificações reconhecidas, o que irá representar a necessária valorização da mão de obra, hoje marginalizada.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Dez Anos de Sal & Mar

No dia 29 de Setembro, o Iate/Motor Gattina completou dez anos de atividade. Seu lançamento aconteceu em uma área pouco movimentada do Porto de Santos, com apenas uns poucos participantes, visto que se tratava de uma área restrita ao público.

Depois de lançado, ele foi rebocado até uma vaga das “Malvinas”, a marina do Iate Clube de Santos, que fica no Guarujá. Após ser finalizado, seguiu para o Rio e depois Angra, sua base até os dias de hoje.




Foi apenas em Agosto de 2005 que embarquei, assumindo o comando do barco e uma missão, fazê-lo funcionar de acordo com os desejos de seu proprietario e prepara-lo para grandes viagens. De lá para cá, cruzamos cerca de 39.000 milhas náuticas, mais de 70.000 km, tendo mantido acionados seus motores por cerca de 5.000 horas. Não há como somar os milhares de litros de diesel e lubrificantes, assim como os filtros trocados e outros componentes. Não há como estimar o número de refeições, as rolhas liberadas dos gargalos, os dias de sol ou as tormentas e mares encapelados (foram muitos) que enfrentamos. Podemos sim, ter uma ideia dos portos por onte passou e as lembranças que deles guardamos.

Abaixo, publico um resumo de todas nossas principais viagens, ano a ano, de forma a dar uma ideia do que foram estes últimos dez anos, registrando que estamos aptos, como sempre, a colocar a proa para qualquer destes destinos, seguindo para mais um longo período de travessias e experiências.

2005: Primeiro teste: Recife e Fernando de Noronha
Angra – Rio de Janeiro – Recife – Fernando de Noronha – Recife – Salvador e Recôncavo – Morro de São Paulo – Salvador – Angra dos Reis.

2006: Bate-e-Volta à Europa
Angra – Rio de Janeiro – Recife – Mindelo (Cabo Verde) – Gran Canaria (Ilhas Canarias) – Villamoura (Portugal) – Rota (Espanha) – Gibraltar – Benalmadena – Almeria - Cartagena – Palma de Mallorca, Ibiza, Formentera e Menorca nas Baleares – Alghero, Carloforte em San Pietro e Cagliari na Sardenha – Palermo - Favignana – Lampedusa – Siracusa – Carloforte em San Pietro – Cartagena – Gibraltar – Gran Canária - Mindelo – Fernando de Noronha – Recife – Vitoria – Abraão e Marina do Piratas em Angra dos Reis.

2007: Salvador e Recôncavo
Angra – Rio – Vitória – Caravelas – Abrolhos – Camamu e Maraú – Morro de São Paulo – Salvador e Recôncavo – Angra dos Reis.

2008: Caribe
Angra – Rio – Fortaleza – Grenada – St. Vincent - Union Island – Bequia – St. Lucia – Martinica – Dominica – St. Maarten.

2009: Caribe + Flórida + Europa Mediterrânea e Regresso ao Brasil
St. Barth – St. Marteen - St. Thomas – Tortola – Norman Isl. – Virgin Gorda – Soper’s Hole – St. Thomas – Virgin Gorda – Soper’s Hole - Puerto Rico – Puerto Plata na Republica Dominicana – Great Inagua, Hogsy Reef, Clarence Town, Great Exuma e Nassau nas Bahamas – Fort Lauderdale. Neste último, embarcamos nosso casco no Dockwise SuperServant IV, com destino a  Toulon na França Mediterrânea – Poqueroles - St. Tropez – St. Raphael – Baie D’Agay – Calvi, Ajaccio, Bonifacio e St. Laurent na Córsega – Villefranche Sur Mer - Nice – Sanremo – Genova – La Spezia – Rapallo – Genova – Nice – Genova – Portofino – Isola Palmaria – Portovenere – Punta Mezzana – Viareggio – St. Stefano – Elba – Roma Ostia – Gaeta – Ponza – Ischia – Procida – Capri – Faraglioni – Amalfi – Positano – Nerone – Gaeta – Roma Ostia – Gibraltar – Gran Canária – Mindelo – Salvador (singramos 10 dias initerruptos, cumprindo 2070 MN) – Rio de Janeiro – Angra dos Reis.

2010: Fernando de Noronha
Angra – Rio – Salvador – Suape – Cabedelo – Natal – Fernando de Noronha – Natal – Salvador e Recôncavo – Morro de São Paulo – Cayru – Camamu e Maraú – Ilhéus – Sto André de Cabrália – Caravelas – Vitória – Rio de Janeiro – Angra dos Reis.

2011: Florianópolis + Regata dos Clássicos em Búzios
Angra – Rio de Janeiro – Parati – Ubatuba – Ilhabela – Ilhas – Guarujá – Paranaguá – São Francisco do Sul – Joinville – Porto Belo – Florianópolis – Angra dos Reis. Angra – Rio de Janeiro – Cabo Frio – Buzios – Rio – Angra.

2012: Florianópolis + Viagem para Guarujá
Angra dos Reis – Ilhabela - Paranaguá – São Francisco do Sul – Porto Belo – Florianópolis – Angra dos Reis.

2013: Salvador
Angra dos Reis - Rio de Janeiro – Salvador – Recôncavo – Morro de São Paulo e Cayru – Camamu e Maraú – Ilhéus – Sto André de Cabrália – Caravelas - Abrolhos – Vitória – Rio de Janeiro – Angra dos Reis.

Olhando assim, na base da lista, parece até uma lista de escalas de um navio de passageiros, mas não foi este o caso, e muitas experiências foram vividas de forma intensa em cada uma destas escalas.

Poucos iates no Brasil tem estas historias para contar, e com raras exceções a maioria nunca navegou além do eixo Rio-Santos, abrindo mão de conhecer nossa Baia de briza morna, chamada de Todos os Santos, ou indo degustar as frescas ostras do litoral catarinense, retiradas de seus flutuantes, bem ao lado do barco.
Espero que a imaginação do leitor o leve para além dos destinos costumeiros, e abra sua mente para novos rumos e experiências.