Caso você leitor tenha assistido a vídeo-entrevista do Marcio Dottori comigo para o Minuto Náutico, deve ter ficado com mais dúvidas do que certezas. Devido ao pouco tempo possível, apenas tocamos levemente nos pontos de maior dúvida a respeito desta tragédia. (https://youtu.be/4SuSSRmESBw)
Desde
o início a imprensa soltou opiniões e levantou suspeitas, que a meu ver,
visavam tão somente criar interesse pelas matérias e acelerar a “clicagem” em
seus canais.
O que
sabemos que não aconteceu? As autoridades italianas sob forte pressão se fechou
como ostra, pois os interesses são enormes. Dentre eles, o Construtor (um dos
maiores grupos do país) a Seguradora do barco e das vítimas, a RINA, Sociedade
Classificadora que aprovou o projeto e a construção do barco e a grande
imprensa internacional. Assim, assumiram a centralização de todos os dados,
para impedir que especulações desviem os rumos e os resultados da investigação.
Nas
primeiras notícias culparam o mastro por ter quebrado e causado o naufrágio, o
que foi descartado pelos mergulhadores logo no primeiro momento, antes de ser
imposta essa comentada e necessária Lei do Silêncio. Foi anunciado que o casco
não tinha nenhum tipo avaria e que o gigantesco mastro jaz intacto. Veremos
adiante que a imprensa chegou perto, mas talvez não tenha interpretado a
situação de forma correta.
Também
acusaram do barco estar ancorado ou muito longe ou perto demais, algo que até
agora não entendi. O barco afundou com a âncora bem unhada no fundo. Ele estava
parado a meia milha náutica da costa, o que é quase um quilometro, algo muito
bom para um barco destes. Outra coisa é que a lâmina de água tinha 50 metros, e
nem de longe poderia ter batido em qualquer coisa.
As
“janelas” e portas estavam todas abertas! Sim, é possível. Diferentes dos Norte
americanos, os Europeus adoram poder passar alguns momentos no calor. Não é
raro barcos com excelentes centrais de ar condicionado ficarem com os mesmos
desligados, e as vigias e gaiutas todas abertas. Isso pode ter facilitado a
rápida e enorme inundação.
Deixaram os pórticos e
plataformas de acesso do casco abertos, como a lateral, que poderíamos
compreender como um tipo de entrada de serviço, por onde se lançam equipamentos
como motos aquáticas, pranchas, caiaques e mesmo equipamentos de mergulho.
Sabemos que ele possuía uma plataforma na popa que se costuma chamar de Beach
Club, pois é lá que ficam as cadeiras, o bar e todo o necessário para a
diversão dos passageiros. Considero isso pouco provável, pois é meio que uma
rotina em qualquer Iate se recolherem todos os brinquedos, fechando-se qualquer
possível acesso ao interior do barco.
A quilha estava abaixada ou
suspensa? Primeiro, esse barco tem um tipo de quilha retrátil a que chamamos de
Patilhão-bolina. Quase um palavrão. Nos veleiros de pequeno porte, se utilizam
bolinas, que são lâmina de metal ou de fibra de vidro que ajudam o barco a
manter seu rumo. A estabilidade geralmente é fruto da tripulação se pendurar na
borda, fazendo escora. Num barco deste tamanho, essa lâmina, que pode ser fixa
ou retrátil, carrega um enorme peso em sua extremidade, como se fosse um
torpedo, a fim de ganhar estabilidade. Compensando a inclinação causada pelas
velas quando em navegação.
Sabemos pelo rastro eletrônico
do AIS do barco, que eles deram uma velejada naquele dia pois a derrota ficou
registrada em zigues e zagues. Após o passeio vieram em linha reta para o
fundeadouro escolhido. A mim não faz sentido se manter o patilhão arriado
enquanto se navega a motor, pois a resistência é enorme assim como a perda de
velocidade. Portanto, acredito que o Capitão tenha simplesmente virado uma
chave e a enorme bolina lastrada tenha sido recolhida em instantes.
O Estaleiro está crucificando o
Capitão e a Tripulação. No início foi noticiado até que ele teria apenas 22
anos de idade. Nada disso! O Capitão tem 51 anos, nascido na terra de grandes
velejadores, a Nova Zelândia, e trabalha em barcos desde a adolescência. Porque
a tripulação se salvou quase toda e não salvaram os passageiros? Normalmente a
área da tripulação fica bem perto da proa e com acesso rápido ao convés, além
disso eles viviam no barco e conheciam todos os caminhos, e por instinto até
com o barco muito inclinado tiveram essa possibilidade de salvação. Por que não
entraram na cabine principal para salvar as pessoas? Ao que sabemos, o barco emborcou
(virou de quilha para o céu) e afundou em muito poucos minutos. Desculpe, mas
se a situação foi a descrita acima, não tinham como entrar naquele barco.
A tempestade fez afundar o
barco? Também, sendo o gatilho que desencadeou a tragédia. Não se sabe se foi
uma Tromba d’água ou um Microburst, no Brasil costumamos chamar de
micro-explosão atmosférica. Um fenômeno que costuma trazer um vento fortíssimo
que desce na vertical espalhando rajadas em todas as direções e com grande
intensidade. Meteorologistas dizem que os ventos podem chegar a mais de 200
km/h. Estes ventos poderiam inclinar um casco gigantes destes? Sim, por certo.
A área vélica do enorme mastro e seus cabos e acessórios ultrapassa os 100
metros quadrados, e pesa mais de 12 toneladas, segundo algumas fontes.
Estamos inclinados a dizer que a
imprensa acertou no vilão, mas não na ação.
Nossa impressão é que o imenso
mastro foi o principal causador do acidente. Não por ter quebrado, mas
ironicamente por não ter quebrado! Ventos fortíssimos atingiram o barco fazendo
o mesmo deitar. Com as gaiutas e vigias abertas, deve ter acontecido uma enorme
inundação e devido a isso o barco acabou emborcando e afundando. Se o mastro
tivesse quebrado, talvez ele não tivesse deitado, e se ergueria com um enorme
prejuízo, mas sem vítimas.
Caramba! O que aconteceu afinal
de contas? Somente o inquérito poderá levantar todas as informações e chegar a
uma conclusão. Como dito no vídeo, um acidente destes é sempre um somatório de
coisas imprevistas que acontecem e resultam em algo assim.
Porque chamei este texto de
Trágica Ironia? O nome Bayesian traduzido pelo Google resulta em “Baiesiano”,
ou seguidor da Lei ou Teorema de Bayes uma fórmula utilizada em estatística que
calcula as chances de um evento acontecer com base em dados e conhecimento
prévio das variáveis. Também chamado de “calculo que prova milagres”, triste
ironia que desta vez o somatório das variáveis não tenha resultado em um
milagre, mas em uma tragédia. Lamentável.